Descumprimento da Lei da Reforma Psiquiátrica em decisões judiciais no município de Aracruz, Estado do Espírito Santo
DOI:
https://doi.org/10.62530/rbdc25p220Palavras-chave:
internação compulsória, garantismo jurídico, saúde mental, Reforma Psiquiátrica, decisões judiciaisResumo
O problema investigado neste artigo consiste no descumprimento da Lei 10.216/2001, conhecida como Lei da Reforma Psiquiátrica, em decisões judiciais proferidas pela Vara da Fazenda Pública de Aracruz/ES, o que evidencia o descompasso entre a norma e a prática. O objetivo foi analisar de que modo a atuação judicial preserva os direitos fundamentais das pessoas em situação de saúde mental, considerando o caráter excepcional da internação compulsória e os princípios do garantismo jurídico. Nos métodos, realizou-se uma análise qualitativa de vinte decisões judiciais proferidas entre 2024 e 2025, cotejando-as com os dispositivos da Lei 10.216/2001, as resoluções do Conselho Federal de Medicina e a literatura especializada em Reforma Psiquiátrica, Direito Sanitário e bioética. Os resultados apontam ausência de fiscalização prévia das clínicas, transferência de pacientes para municípios distantes, falta de comprovação do esgotamento de recursos extra-hospitalares e laudos médicos genéricos ou incompletos, o que fragiliza o devido processo legal e o caráter excepcional da medida. Como conclusão, constatou-se que a prática judicial tende a banalizar a internação compulsória, perpetuando lógicas manicomiais e produzindo efeitos de cronificação e isolamento social. Recomenda-se a elaboração de laudos médicos circunstanciados completos, inspeções prévias e criação de leitos regionais, a fim de alinhar o Poder Judiciário aos princípios da Reforma Psiquiátrica e à proteção da dignidade humana.
Referências
AMARANTE, Paulo. Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1998. DOI: https://doi.org/10.7476/9788575413357
AMARANTE, Paulo. Saúde mental e atenção psicossocial. 4. ed. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2011.
BIRMAN, J.; COSTA, J. F. Organização de instituições para uma psiquiatria comunitária. IN: AMARANTE, P. Psiquiatria social e reforma psiquiátrica. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1994. Disponível em: https://books.scielo.org/id/9kdvf . Acesso em: 17 set. 2025. DOI: https://doi.org/10.7476/9788575415061.0003
BOBBIO, Norberto. Teoría general del Derecho. 2. ed. Madrid: Debate, 1991.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm . Acesso em: 10 set. 2025.
BRASIL. Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001. Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. 2001. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10216.htm . Acesso em: 10 set. 2025.
BRASIL. Ministério da Saúde. 20 anos da Reforma Psiquiátrica no Brasil: 18/5 – Dia Nacional da Luta Antimanicomial. Brasília: Ministério da Saúde, 2021. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/20-anos-da-reforma-psiquiatrica-no-brasil-18-5-dia-nacional-da-luta-antimanicomial/ . Acesso em: 13 set. 2025.
BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Resolução RDC nº 29, de 30 de junho de 2011. Dispõe sobre requisitos de segurança sanitária para o funcionamento de instituições que prestem serviços de atenção a pessoas com transtornos decorrentes do uso, abuso ou dependência de substâncias psicoativas. 2011b. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2011/res0029_30_06_2011.html . Acesso em: 17 set. 2025.
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 1.646, de 2 de outubro de 2015. Institui o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES). Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 5 out. 2015. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2015/prt1646_02_10_2015.html . Acesso em: 17 set. 2025.
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). 2011a. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt3088_23_12_2011_rep.html . Acesso em: 17 set. 2025.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Reforma Psiquiátrica e Política de Saúde Mental no Brasil: 15 anos depois de Caracas. Brasília: Ministério da Saúde, 2005. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/Relatorio15_anos_Caracas.pdf. Acesso em: 13 set. 2025.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (3ª Turma). Habeas Corpus nº 766.226/SP (2022/0266713-1). Relator Ministra Nancy Andrighi; Relator p/ acórdão Min. Ricardo Villas Bôas Cueva. Julgado em 7 fev. 2023. Brasília, 2 mar. 2023. Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Comunicacao/noticias/Habeas-Corpus-766226 . Acesso em: 17 set. 2025.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA (CFM). Resolução CFM Nº 2.381/2024. Normatiza a emissão de documentos médicos e dá outras providências. 2024. Disponível em: https://crmpi.org.br/wp-content/uploads/2024/07/2381_2024.pdf Acesso em: 17 set. 2025.
CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA (CFP). Hospitais psiquiátricos no Brasil: relatório de inspeção nacional. 2. ed. Brasília: CFP, 2020. Disponível em: https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2019/12/549.3_ly_RelatorioInspecaoHospPsiq-ContraCapa-Final_v2Web.pdf Acesso em: 15 set. 2025.
CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA (CFP). Relatório de Inspeção Nacional: Manicômios Judiciários. Brasília: CFP, 2019. Disponível em: https://site.cfp.org.br/relatorio-sobre-manicomios-judiciarios-denuncia-graves-violacoes-de-diretos/ . Acesso em: 13 set. 2025.
DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
FERRAJOLI, Luigi. Diritto e ragione: teoria del garantismo penale. 11. ed. Bari: Laterza, 2018.
FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Teoria da norma jurídica. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
FIGUEIREDO, Carolina. MPSP instaura inquérito contra Prefeitura por internações involuntárias na Cracolândia. Cnn Brasil, São Paulo, 14 jun. 2022. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/mpsp-instaura-inquerito-contra-prefeitura-por-internacoes-involuntarias-na-cracolandia/ . Acesso em: 13 set. 2025.
GOFFMAN, Erving. Manicômios, prisões e conventos. São Paulo: Perspectiva, 1974.
KELSEN, Hans. Teoria geral das normas. São Paulo: Martins Fontes, 1986.
KELSEN, Hans. Teoria pura do Direito. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
KIST, C.; TANJI, T. Políticas higienistas nas cidades podem apenas esconder problemas. Galileu, 26 mai. 2017. Disponível em: https://revistagalileu.globo.com/Revista/noticia/2017/05/o-que-voce-faz-para-mudar-sua-cidade.html . Acesso em: 13 set. 2025
LASSALLE, Ferdinand. A essência da Constituição. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001.
ORGANIZACION PANAMERICANA DE LA SALUD (OPS); ORGANIZACION MUNDIAL DE LA SALUD (OMS). Declaración de Caracas: Reestructuración de la Atención Psiquiátrica en América Latina dentro de los Sistemas Locales de Salud (SILOS). Caracas: OPS/OMS, 1990. Disponível em: https://www3.paho.org/hq/dmdocuments/2008/Declaracion_de_Caracas.pdf . Acesso em: 13 set. 2025.
SILVA, Josimário. Deliberação moral e tomada de decisão em bioética clínica. 2. ed. Recife: Plena Voz, 2024.
Downloads
Publicado
Declaração de Disponibilidade de Dados
Não se aplica